sábado, 26 de setembro de 2015

Chove ao longe, Os pássaros embicam mais uma canção que ficará esquecida por entre as folhas As árvores murmuram entre si a nostalgia íntima de mais um fim de tarde Repousa a fogueira triste em brasa, lembrança das cinzas sopradas ao vento Ao longe a luz de uma lâmpada nos faz esquecer do dia e a conversa dos sapos nos faz lembrar da noite Meu coração silencia para nenhuma interferência entre o som do bater da asa de uma borboleta e o caminhar de um lagarto no quintal O Sol se aquietou nas mãos do tempo e o que antes eram galhos e troncos formou uma imensa teia erguida de sombra retorcida. Diego Rocha do livreto “Antes da Chuva” 21/03/2010

quarta-feira, 7 de março de 2012

O LAMPIÃO

O menino ia pelo chão,
De lagarto a caracol o seu corpo ia sabido.
Ao longe, meia luz do lampião
Iluminava o rosto garimpado pela idade.
Até chegar de tropeço desequilibrando cada passo.



Diego Rocha

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

DA FONTE

Criei um menino sem comprometimento com as coisas sérias,
Bastardo para as horas,
Inútil para calendários,
Mas com um grande gosto para nada,
Pontual em acordar os galos,
Faceiro pra peixe,
Sutil pra lagarto
E imenso para mato.
Esse menino é tudo o que eu não fui.
De banho em chuva ele é sabido,
De subir em árvore é ligeiro e na copa é pássaro de trazer notícias.
Faz tudo às surpresas que quando entra em casa pela porta da frente
Pensam que é suspeita de febre,
Mas ele não tem tempo de adoecimento.
Ele é infinito dentro de mim e quando acorda, acordo,
Quando dorme, durmo,
Quando chora, choro,
Quando ri, sorrio.
Ele é anterior a minha consciência
E atual em minhas atitudes.
Diz ele que a solução de todos os problemas
É multiplicá-los por nada.


Diego Rocha

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Naquela tarde em cima de sua bicicleta
Ele vestiu a sua jaqueta
Arrumou a sua pala-
E vrão, vrão, vrão.
Desafiou dez-
Mentindo ser ligeiro.
Ele que só-rio
De não carecer de ver-
Idade
Para ser gente
De tão sul-ave.


Diego Rocha

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

MARIA

Salve Maria, as horas da vida
Que o escuro é dia
E o dia amanhece calado
Corre Maria, salve outro mundo
Que em cima do muro
Eu permaneço sentado.

Foge Maria, dos homens da noite
O ontem foi hoje
E hoje eu estou tão cansado
Vai Maria, nos dias eternos
Que eu permaneço quieto
Eu permaneço parado.

Olha Maria, o brilho bucólico da lua
Que ilumina esta rua
Que o escuro engoliu
Volta Maria, pro ventre da casa
Vem e me abraça
Que eu estou tão vazio.

Agora Maria, que conheces os caminhos
Não me deixe sozinho
Não me deixe morrer
De pressa Maria, que a luz está acabando
E eu estou te chamando
Pra mais um dia nascer.

Diego Rocha
05/03/08

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

GOSTO PELAS COISAS SEM COMPROMISSO

Aí o dia se fez sem querer,
Brincando entre folhas e formigas no quintal,
Sem falar dos pássaros e a imensidade das árvores
Corpadas, distintas, multiformes...
Deu por si e a manhã passou em sanhaçu.
O interior das panelas murmurava
E a cozinha era um cheiro só de delícia.
Largou o barro, se deixou da terra,
Pediu licença às formigas e correu como se voasse
E entrou voando em casa ligeiro tal beija-flor beijoqueiro
E aquietou-se ao pé da mesa
Esperando o agrado da mãe.
Esse menino tinha um certo gosto de emendar
Uma coisa na outra
E largá-las no espelho da cama para tecer seus sonhos.
Uma vez ele disse a mãe que borboleta é cor voando,
A mãe disse que isso é um vareio da imaginação,
Outra vez disse que quando as formigas querem se perder elas criam asas,
A mãe franziu a testa e disse
Que esse menino realmente tinha gosto para variações,
Não é que ela tava certa.



Diego Rocha
14/12/2008

COMUNICADO III – POEMA DE TRANSGRESSÃO

Prova a minha boca no teu ouvido
Faz-me sentir teu sussurro gritando no teu ventre
Nós dois sabíamos que os sonhos não podem se misturar com a carne
Você estava tão angelical, mesmo tendo uma neblina rasteira nos olhos
Tua mão fria ai abrindo as portas do meu corpo virgem
A minha boca provava o néctar milenar do teu gozo
Eu ainda te sinto, cravando em meu peito tuas unhas
Teu cabelo deslizando sobre a cama
E teu corpo contraindo-se junto com o meu
Os nossos encontros não se diluíram com o tempo na minha memória.

Minhas amantes como eu me dei a vocês e agora não sou nada,
Quando eu me procuro, me perco em nossas noites e quando volto, volto sozinho
Eu ainda estou aqui!
Com o velho olhar perdido no nada, esperando o ranger da porta anunciar alguma novidade,
O que vocês fizeram com todas aquelas promessas?
Com quem vocês alcançaram seus sonhos?
Não há dor maior do que não sentir nada,
Devolvam-me as promessas que fiz a vocês,
Os sonhos que construímos.
Quando abro a minha janela só vejo vocês e uma meia dúzia de filhos nunca nascidos.
Eu estou falando só outra vez.
Meus professores e minha família acham que eu estou muito bem
Mas eles não sabem que eu não servirei as Forças armadas porque minhas continências acabaram
Vocês estão me ouvindo?
Vocês foram e eu fiquei estagnado no cu da Maquinaria
Penteando o passado com as unhas encravadas do destino
Eu não sei onde estou indo
O que significa Diego Rocha na sua lista?
Toda vez que passo em frente à Tabacaria sinto teu cheiro, ó puta do século XXI
Vá se ferrar com seus gingos ocos de beleza e beleza
Sua carcaça esta enferrujada nas minhas veias enquanto eu fomo a tua excreção
Você pensa que eu esqueci quando nois dois éramos jovens e transávamos por todos os cantos
E agora você se prostitui para outro garoto enquanto eu mastigo os textos de Carl Sagan na tua porta dos fundos
Eram tão verdadeiros aqueles dias
Fui eu quem envelheceu durante todos esses anos
Onze de Dezembro de 2007, o que ouve, por que você me deixou só?
Eu estou tentando me equilibrar, mas todo mês as prateleiras permanecem e os preços aumentam
O que você fez com as nossas plantações?
O que vocês fizeram com nossos índios? Vocês queimaram todos?
Vá pro inferno com seu congresso!
Eu te dei tudo e agora não sou nada.

Diego Rocha
11/12/07

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

CICLO

Para minha querida companheira Mayara Castro



A flor bruta que habita em teus olhos
É tão misteriosa quanto a noite de um deserto.
Hoje você faz 23 anos menina,
Vejo teus olinhos querendo brincar,
E o mar que há em teu sorriso vir banhar-nos de alegria,
Devias vim ver menina,
Quantos homens nasceram á teus pés,
Quantos morreram,
Quantos se descobriram homens
E quantos se machucaram por serem homens.
Lembra-te de teu pai menina,
Lembra-te de tua mãe,
Lembra-te de teus filhos,
Lembra-te.
Hoje menina, também és mulher,
De garra e fibra,
De sangue e dor,
De medo e lágrima.
Abrace teus sonhos e não deixe que eles escapem,
Pois o rio de tua vida
Só escapará quando você não mais o desejar.

Diego Rocha
05/03/2010

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A MÃO INTANGIVEL DO AVESSO

A dias não tenho tempo de acontecimento, as horas se arrastam lesmamente durante o dia e a noite,
Por acaso achei uma lembrança escorada dentro de um livro, dez vezes relembrei, dez vezes li, dez vezes chorei.
Nós somos o passado e o futuro, não temos vinculo com o presente, hoje já não tenho o amor das tias, das avós, dos primos, hoje estou resistindo a minha própria existência, não tenho demora de conversações.
Meus amores estão todos fracassados e escritos em cima da mesa, minha bebida acabou, minhas amantes esqueceram o caminho de volta, meus amigos estão todos por aí, espalhados sabe lá Deus por onde.
Minha máquina Olivetti é a única coisa que ainda faz barulho neste quarto.
O universo se abriu na escuridão crepuscular, os sonhos de Vang Gogh e Antonin Artaud estão enferrujados dentro de uma garrafa de Whisky vazia.
Hoje eu pressinto a morte de todos os poetas, os mortos e os ainda vivos e me recuso a esperar para ver a minha.
A porta do possível e do impossível está escancarada, agora eu acredito que a verdadeira vida é a vida fora da matéria, em um ligeiro espaço entre o tudo e o nada é que nós existimos.
Minha mão trepida por abstinência, a consciência natural em que vivemos é limitada, eu quero sentir o infinito correr nos meus olhos, o inatingível tocar meu corpo, quero me embriagar lendo Bukkovisk, Ginsberg, Leno, Burroughs, Kerouac, Marcelo, Whitman, Raina, Neruda, Manoel de Barros, Augusto, O’Hara, Rimbaud, Tamyres, Fernando Pessoa, Arcanjo, Raine...
E por todos aqueles que não foram lembrados.


Diego Rocha

O GRILLO E MOZART

Tem alguma coisa nos grilos que chama a noite.
Uma vez criei um Grillo dentro de casa,
Enquanto ele cantava coloquei Mozart
Para ouvi-lo cantar em clássico.
Fiquei fascinado ao ouvir a opera do Grillo,
Ou diria a Grillada de Mozart?
O Mozart com a terra e o mato do Grillo e etc,
E o Grillo com as cordas e os metais de Mozart e etc.
Os dois se completavam tão bem
Que quando o Grillo se calou
Eu só consegui ouvir Mozart no silêncio.


Diego Rocha